O que faço com minha ansiedade? Essa sem dúvida foi a frase que mais ouvi quando revogada a decisão de entrarmos todos em quarentena. Habitada por misto sentimento de perplexidade e empanzinamento. Me senti impelida a primeiro tentar digerir tudo, antes de sair por aí, dando dicas e dicas que ficariam na prateleira da mente e nunca usadas nos reais momentos de ansiedade.
No meio desse tornado emocional, de ver toda a gente numa expedição pelos pecados capitais( incluindo a mim), me deparei com um inquietante trecho de Ana Holanda, editora da revista Vida Simples. Era sobre paz. Não sobre a paz mundial, mas sobre a quietude interna, de estar na nossa própria companhia, aquele cantinho de silêncio dentro de cada um de nós. Ela cita Henrique Pistilli e nos diz: A gente tem medo de estar no vazio, no silêncio, mas é desse lugar que realmente conseguimos escutar a sabedoria da vida.” E daí olhando para isso, percebo que não é o combate à ansiedade a solução. Mas, na inquietude da possibilidade de podermos ouvir nossos silêncios, nossas memórias. Mais fácil acreditar que pareciam férias, ou que gastaríamos nosso tempo na internet, mas não damos conta. A convivência nos convida a olhar para todas as feridas pendentes. Podemos fazer isso como quem finge que não há feridas, ou podemos finalmente tomar um tempo para olhar para elas com amorosidade.
Ouvindo os nossos perturbadores silêncios, dando oportunidade para dar atenção a essas memórias, criar novas formas de contá-las. Resgatando a harmonia da nossa convivência conosco mesmo. Como uma criança que brinca sozinha construindo universos mágicos com suas memórias. Eu só posso desejar a todos nós que possamos ser sérios, como uma criança que brinca. E possamos estar bem sozinhos, e assim dividirmos uma convivência feliz com aqueles que compartilhamos o lar. Uma quarentena menos necessitada de anestésicos, inibidores e distrações. Que cada um possa ir encontrando a paz de estar em sua própria casa, em sua própria pele. Por tanto dizer passar primeiro pela aceitação e acolhimento. Para vermos fora o que vemos dentro. Olhar para além de todo esse furacão e enxergar o que há de beleza em tudo isso. Como para Pistilli, surfista de uma modalidade sem prancha, que nos complementa: “Para muita gente uma onda gigante é assustadora, eu vejo inspiração.”
E entendendo sobre ilusão e realidade, possamos por fim acomodar, integrar o novo habitante das nossas vidas. Sabendo onde acomodar cada cuidado, conosco e com o outro. Olhando amorosamente para esse co-viver.